terça-feira, 24 de abril de 2012

O Fundamentalismo religioso no trabalho




Veja, com acesso para leitura inteiramente gratuito, o livro "As Seitas Organizacionais" no site do CRA-RJ, biblioteca/acervo digital, que trata da construção de ambientes totalitários no cotidiano das macro corporações complexas do mundo globalizado.Examine se você integra ou já participou deles.

O livro “As Seitas Organizacionais – o fundamentalismo religioso no trabalho” baseia-se nas minhas experiências vivenciadas na realidade das organizações públicas e privadas com as quais tive o privilégio de conhecer em primeira mão, quer como profissional, executivo, consultor, analista e político militante. Ao formular as reflexões e críticas constantes deste livro, tentei fundamentalmente condensar as minhas próprias experiências e observações pessoais, embora muitas delas tenham sido enriquecidas pelos debates com colegas e amigos. A maior parte sobre o que falo não ocorre à luz clara do dia, mas se faz na penumbra e na dissimulação com que muitas organizações escamoteiam as suas verdadeiras realidades. Analiso as contrafações do que se convencionou chamar de responsabilidade social, ética empresarial, empresa-cidadã, voluntariado solidário, governança corporativa, democracia das relações de trabalho, universidade corporativa. Entenda-se por contrafação tudo o que se produza de falso, fraudulento, artificial, enganoso, manipulativo, distorcido ou postiço na concepção e prática dessas políticas e processos tão em voga no mundo das organizações complexas dos tempos presentes. Aglutino todas essas contrafações no que genericamente denomino de "Seitas Organizacionais".

Considero que o surgimento das seitas no mundo do trabalho seja uma investida totalitária por excelência nas relações sociais existentes nas organizações, com sérias repercussões para a predominância da democracia na sociedade contemporânea.

Não incluí tantas notas de rodapé nem tantas citações de grandes pensadores da gestão empresarial como seria natural esperar num trabalho desta espécie. Optei por descrever o que vi e ouvi, o que presenciei, constatei e participei, e sobre o que fiz ilações, produzi reflexões, comparei, confrontei e investiguei a meu modo com outras realidades com as quais não convivia diretamente. Cheguei às minhas conclusões.

Aqui não há verdades irrefutáveis, possivelmente algumas generalizações injustas. Talvez o leitor possa ficar de orelha em pé e olhos bem abertos indagando-se se a sua própria organização não seria também uma seita de devoção ao trabalho. Se isto acontecer, eu já terei cumprido o propósito pelo qual me dispus a escrever tanto. Muitos dirão que estou enganado sobre tudo o que descrevo e acuso. Vão até apresentar fatos e argumentos em contrário. Lamento, mas aqui apenas ofereço a interpretação dos ambientes organizacionais complexos de grandes corporações que conheço, quer por deles participar quer por os haver investigado com os olhos atentos forjados numa longa jornada profissional, tanto como gestor, consultor e como político. Vi a realidade das organizações serem produzidas. E aprendi muito, ora perplexo ora escandalizado, muitas vezes surpreso, outras tantas indignado. Neste livro tento destilar a essência de tudo isso. Relato as minhas desilusões, mas aponto expectativas e esperanças de um novo tempo.

Não me dirijo a um leitor comum de temas sobre a gestão das organizações e a ciência da administração. Normalmente esse rejeita a reflexão crítica da realidade em que vive e prefere a indicação de caminhos e rumos a trilhar para o sucesso imediato. Aqui vai encontrar a denúncia e a revolta contra escândalos da realidade social das macro organizações complexas em que vicejam a deformação de valores, a distorção de papéis, a prevalência da esperteza e da hipocrisia, a teatralização das aparências, a manipulação de pessoas, a deformação de caráter e a legitimação de práticas que coisificam o ser humano. Aí sim, ao denunciar, traço alternativas a seguir para que o leitor individualmente escape da mesmice e se liberte, se for o caso, dos ardis a que possa estar submetido sem se ter ainda dado conta.

O equívoco essencial de quem se propõe a examinar a realidade social é a de vê-la somente sob a sua perspectiva. A objetividade é sempre ilusória. A análise dos consultores de organização mundialmente reconhecidos revela discordâncias sobre pormenores e detalhes os mais elementares. Muitos afirmam que algo está errado, incorreto ou distorcido para contraporem-se ao que acreditam ser um equívoco de fato, mas que na verdade revela muitas vezes apenas percepções diferentes para o mesmo fato. Tamanho equívoco essencial leva à busca seletiva de fatos, idéias e conceitos justamente para sustentar e defender um ponto de vista na compreensão de determinada questão. Espero que tenha preponderantemente escapado dessa sutil armadilha. De qualquer forma, a viagem que ora empreendo à realidade dos tempos presentes das organizações pode ser comparada a de um turista recém chegado a um país estrangeiro: muito do que vê é distorcido ou impreciso, mas também é capaz de perceber dimensões e peculiaridades que os habitantes nacionais não conseguem enxergar por as terem assumido como naturais, por conviverem com elas no cotidiano. Não despreze, portanto, as impressões e percepções que lhe apresento para análise. Confronte-as com a sua própria realidade.

Espero que este esforço de síntese abra um debate sobre a perigosa tendência da transformação das organizações em seitas. A história da humanidade nos mostra que quando as religiões são preponderantes, elas passam a impor os seus valores nas instituições políticas e nos costumes de uma sociedade. É o totalitarismo teológico a determinar o cotidiano de nossas vidas, agora também no mundo do trabalho. Cultiva-se a idolatria da organização como fim supremo do ser humano na sua busca de felicidade.

É evidente que não apresento um caminho novo para as organizações. Talvez o que tenha de novo é o jeito de olhar e perceber uma realidade social que pouco a pouco se descortina no cotidiano do mundo do trabalho. E, mais do que isso, a convicção de que essa tendência não pode continuar a prosperar. Por certo, nem tudo que se enfrenta pode ser modificado ou descontinuado. Mas nada será modificado se não for enfrentado já, a partir de agora.

Publicado em 12-Mar-2012, por Wagner Siqueira, no site: www.gestopole.com.br

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