quarta-feira, 17 de outubro de 2012
Quando tudo está sob controle, você não está correndo o suficiente! (1/2)
Revisão periódica:
Já se passara um ano desde aquela cerimônia que misturou stress, emoção, comoção e em que, finalmente, a empresa obtivera a sua "recomendação" à Certificação.
Naquela data, o presidente, diretores, média gerência, todos vieram à reunião de encerramento da auditoria de (re) certificação conforme a norma NBR ISO 9001. Após as formalidades e os comentários dos auditores, a decisão final tão esperada: "O time de auditores recomenda a empresa à certificação. Parabéns a todos!".
Empresa certificada. Vitória! Sucesso! Que maravilha!
Agora, a diretoria executiva está reunida para uma nova análise crítica periódica do Sistema de Gestão em uso.
Caminhando para a sala de reuniões, João, o RD Representante da Direção da empresa, vai repassando mentalmente todos os pontos da pauta e se tranqüiliza: sente-se bem preparado para fazer a apresentação. Indicadores, gráficos, justificativas e um elenco razoável de realizações serão mostrados, para orgulho de todo o time. E relembrou:
Política da Qualidade > Objetivos e Metas > Monitoramento > Justificativas
Terminada a reunião, finda também o eco das colocações solitárias do RD à calada platéia! Todos observaram os comentários positivos e negativos, pontos ameaçadores e o Painel de Indicadores. Tudo está sob controle. Já é perceptível uma pequena melhora nos resultados em relação ao patamar atingido no ano passado. Os resultados, em sua maioria, já se movimentam em direção às metas traçadas.
O RD se antecipa à diretoria executiva e parabeniza a equipe ao término da apresentação. No momento final, abre a discussão ao plenário e constata, surpreso, não haver questionamento, dúvida ou comentário a ser feito por qualquer dos presentes. Resta-lhe agradecer o comprometimento de todos, facilmente caracterizado na presença maciça à reunião e a declara encerrada. Olhou suas anotações e seu resumo da reunião:
Painel de Indicadores > Melhoria > Compromisso atingido
Pós-revisão:
O presidente entra incomodado em sua sala, após a reunião de análise crítica periódica. Aliás, ele tinha o hábito de, após cada reunião gerencial, sentar-se sozinho em sua sala e avaliar a eficácia de cada reunião de que participava!
Ao revisar os pontos da reunião de análise crítica, lembrou-se dos comentários dos acionistas, de que "estava mais do que na hora de uma intervenção profunda na empresa, com mudanças de ênfase e enfoque, para reverter a queda nas vendas e aumentar as margens de lucratividade"!
O presidente não conseguiu controlar um certo desânimo: nada ia bem, apesar de os controles gerenciais indicarem o contrário.
Lembrou-se de uma frase de um piloto da antiga Fórmula Indy, de quem era um fã: When everything seems under control, you may not be running enough (Quando tudo está sob controle, você não está correndo o suficiente).
Realmente, entendia melhor, agora, o significado da solidão no poder. João, seu bom e caro amigo, Representante da Direção (RD) da empresa, acabara de apresentar um elenco de resultados prá lá de bons, mas que, aparentemente, nada mais tinham a ver com a atual realidade da empresa. E ele, o presidente, não podia comentar isto com ninguém, sob risco de desmotivar todo o time. Pior que isto: não conseguia entender como foi que se chegou àquela situação.
A consultoria que o ajudou era especializada em Certificação, as referências sobre ela eram excelentes e mesmo os consultores designados conheciam profundamente a norma e as exigências para a certificação. Além disso, as diferentes discussões sobre adoção de indicadores demandaram um tempo bastante razoável dos membros da diretoria executiva. Constatar, agora, que havia tanta coisa insuficiente, e que o julgamento dos acionistas era duro, severo, quase uma ameaça à segurança e manutenção dos empregos, era pesaroso.
E tinha também o processo de certificação! Tantos elogios dos auditores!
É bem verdade que a grande mudança que se fez no Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ) foi alterar alguns dos 20 procedimentos obrigatórios então existentes e criar alguns indicadores de desempenho a partir da Política da Qualidade. Mas não foi apontada qualquer deficiência no SGQ com essa abordagem e isto foi bastante comemorado. O processo transcorrera em clima tão amistoso e cordial!!!
Como entender e como equacionar a situação era o seu problema mais urgente e mais crítico. E, verdade seja dita, com tanta necessidade de contatar o cliente, ele não via como arranjar tempo para tantas demandas. Parecia que os dias iriam continuar longos e a jornada de trabalho não ia se encurtar tão cedo...
Então ele se lembrou que os Indicadores Financeiros não estavam contidos no Painel da empresa, apesar dos protestos e insistência da consultoria, pois uma discussão interna havia mostrado consenso de que dinheiro, na verdade, nada tinha a ver com qualidade. E os gerentes argumentaram que o acompanhamento desses indicadores já era feito! Então o presidente se lembrou de que, várias vezes, o consultor o procurou para manifestar preocupações com algumas decisões tomadas. Pelo jeito, o consultor resolveu deixá-los aprender com o tempo!!!
O presidente estava já se convencendo de que algo tinha que mudar.
Amaury Silvio Botelho | Publicado em: 20/08/2012, no site: www.qualidadebrasil.com.br
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