quarta-feira, 1 de julho de 2009

O Administrador e o Empresário

Repetindo a postagem de 30.05.2009 do claudiiblog, por ser pertinente a esta área.

A Ascensão do Administrador e a Decadência do Empresário.

O caso Sadia-Perdigão.A fusão da Perdigão com a Sadia (na realidade, o salvamento da Sadia pela Perdigão) foi fruto de uma mudança de mentalidade que vem ocorrendo no Brasil e que merece ser bem analisada.
A Perdigão foi fruto de uma gestão profissional de administradores competentes -- não de sócios nem de donos da empresa.
Nildemar Secches substituiu a família de empreendedores ou fundadores, os Brandalise, que venderam a Perdigão em 1994 com problemas. A empresa foi comprada por fundações e fundos de pensão.Eles substituíram a gestão familiar -- ou “empreendedora” -- por um gestão profissional.
No Estatuto da época, estava escrito que os administradores teriam de ser pessoas com escolaridade acadêmica comprovada. Algo que a maioria dos “empreendedores” não tinham.
De 1994 para cá, a Perdigão não parou de crescer e ultrapassou a Sadia, líder de mercado, mas ainda nas mãos de duas famílias, Fontana e Furlan.
Na realidade, nas mãos de filhos dessas famílias, sem o tino comercial e o empreendedorismo dos pais.Filhos de famílias outrora empreendedoras tendem a se preocupar com maximização de controle familiar. Têm medo de perder, são conservadores. Você faria o mesmo.
Arriscar-se e perder tudo, nem pensar!
Preferem crescer a um ritmo menor, reinvestindo lucros, a crescer aceleradamente mas perdendo controle familiar e abrindo o capital, permitindo, inclusive, que fornecedores e trabalhadores possam participar no sucesso da empresa.
Na Sadia, as duas famílias tinham poder sobre o diretor financeiro, que respondia diretamente ao Conselho, e não ao Presidente da empresa, como seria em qualquer empresa profissional.O diretor financeiro não era formado em administração financeira, e temia ser despedido pelo Conselho se seguisse os preceitos da boa administração.
Um diretor financeiro profissional teria dito ao Conselho Familiar que especular com derivativos não fazia parte do Objeto Social da empresa. “Nosso 'core business', senhores, é frango e suínos, e não especular com câmbio”.“Parágrafo 3º - É expressamente vedado e será nulo de pleno direito o ato praticado por qualquer administrador da Companhia que a envolva em obrigações relativas a negócios e operações estranhas ao objeto social, sem prejuízo da responsabilidade civil ou criminal, se for o caso, a que estará sujeito o infrator deste dispositivo.”Mas empresas familiares e de “empreendedores” não seguem os preceitos da ciência da administração; criam organogramas para satisfazer as vontades do “empreendedor” e estatutos que não precisam ser respeitados -- “a lei somos nós”, dizem os “empreendedores”.
Esta fusão fará da Sadia uma empresa profissional. O administrador financeiro será um administrador financeiro, e não alguém “especializado em arbitragens e distorções nos preços de mercado” sem formação em administração.
Alguém que saberá a diferença entre hedge e especulação. Que dirá aos Conselhos da Família: “Quem quiser especular que o faça na pessoa física, não nesta empresa, colocando em risco nossa sustentabilidade e a segurança da nossa força de trabalho”.
O triste desta história é que, apesar de 40 anos de má gestão, as duas famílias saíram com uma parcela muito acima do que mereceriam da nova empresa.Tinham 23% da Sadia, ficaram com 12% da Brasil Foods. Quase quebraram a Sadia, cujo patrimônio beirava zero, dependendo de que hipóteses do futuro fossem usadas. E, mesmo assim, saíram ricos...Por quê? Porque uma empresa com patrimônio dilapidado, quase zero, ainda vale muita coisa.
Vale a marca Sadia, construída pelos empreendedores originais.
Vale a sinergia de ser comprada por uma empresa maior e mais eficiente.
O que significa isso? Se a Perdigão comprar a Sadia, ela deixa de precisar da equipe de vendedores da Sadia; é só aumentar a lista de produtos para vender. Antes eram dois vendedores visitando o mesmo supermercado; agora só precisam de um.
Era obvio que haveria demissões, e era óbvio que a diretoria não poderia anunciar isto na imprensa antes de conversar com os proprios funcionários as serem eventualmente demitidos.Digamos que esta sinergia seja de 2 bilhões de reais, e de zero se as duas empresas não se juntarem.Se você fosse Luiz Furlan, você diria: “eu quero parte deste lucro da sinergia, apesar de não merecê-la, porque a empresa agora é sua”?Se você fosse Nildemar Secches, você aceitaria oferecer uns 600.000.000, ou até um bilhão, a mais na compra porque a alternativa seria zero?Para um administrador profissional, essas brigas de controle ou “participação acionária” são menos importantes, por isto Nildemar aceitou.
O importante para o administrador profissional é criar uma empresa mais eficiente e competitiva internacionalmente, e não manter o controle acionário na família.Se Nildemar Secches fosse um “empreendedor” ou patriarca de uma família, provavelmente teria recusado fazer a fusão, como fez o Rolim Amaro, da TAMOs mesmos Fontana abortaram uma fusão entre a TAM e a Transbrasil, que teria criado uma empresa internacional poderosa, a Tambrasil.
Mas Rolim, outro empreendedor, jamais aceitou uma exigência injusta como dividir a sinergia da nova empresa.
A fusão é um marco de uma nova era neste país.
Enquanto nossos comentaristas estavam preocupados com o fato de que muitos funcionários da Sadia iriam perder o emprego, deixaram de perceber que é justamente disto que o Brasil precisa: empresas que possam competir com as enormes empresas chinesas que teremos competindo com nossas empresas, daqui uns 10 anos, mais ou menos.

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