sexta-feira, 18 de março de 2011

Caso PanAmericano e governança corporativa


Publicado em 25-Feb-2011,  por Antonio Dias Pereira Filho


      O caso do Banco PanAmericano, vendido pelo empresário Silvio Santos ao BTG Pactual no limiar deste mês, suscita um questionamento sobre a eficácia do modelo dominante de governança corporativa adotado nas empresas.
        O capitalismo contemporâneo é marcado pela presença de grandes empresas ou corporações. São elas que dão as cartas do jogo no mundo dos negócios, exercendo grande influência sobre os rumos da economia mundial. Essas empresas são quase sempre constituídas sob a forma de sociedades anônimas. Nestas o capital é dividido em ações cuja propriedade pertence geralmente a milhares de acionistas. A propriedade é, portanto, pulverizada, implicando em dificuldades de gestão. Resulta daí a necessidade de delegar a terceiros a condução dos negócios. Estabelece-se, assim, uma relação de agência tendo, de um lado, o principal (proprietário/acionista) e, de outro, o agente (dirigente/gestor). Principal e agente nem sempre possuem interesses convergentes. Há conflitos entre ambos. Cada um busca, em princípio, maximizar a sua própria riqueza. Ademais, eles são capazes de prognosticar racionalmente os efeitos das relações de agência sobre seus resultados futuros. Em sua obra “A riqueza das nações”, Adam Smith já previa a possibilidade de os profissionais de gestão não dispensarem à riqueza alheia o mesmo zelo que dispensariam aos seus próprios recursos. Do mesmo modo, em 1932, Berle e Means chamaram a atenção sobre os problemas associados à separação entre a propriedade e o controle dos fatores de produção na grande empresa capitalista. Esses conflitos são analisados pela chamada teoria da agência – desenvolvida por Jensen e Meckling em 1976 – que coloca o acionista no centro de suas preocupações, buscando oferecer-lhe um conjunto de mecanismos com o objetivo de mitigar suas perdas nas relações com os dirigentes. Essa teoria fornece contribuições importantes para o estudo da governança corporativa.
        Segundo a lógica dominante, governança corporativa representa uma estrutura capaz de assegurar aos investidores o retorno sobre seus investimentos. Ela seria uma espécie de “gestão da gestão”. Para isso, são adotados mecanismos de controle dentre os quais se destacam os sistemas de compensação (remuneração baseada no desempenho), regulamentos, controles internos e auditorias. Aliados a esses, há também os mecanismos externos de controle que compreendem, sobretudo, os órgãos reguladores (o Banco Central, no caso das instituições financeiras), o mercado financeiro e o próprio mercado de trabalho, este último exercendo o seu controle por meio da redução da empregabilidade de dirigentes cuja imagem profissional foi maculada. Não obstante todo esse arsenal de controle, a administração do banco PanAmericano conseguiu produzir, por meio de fraudes contábeis, um rombo superior a 4 bilhões de reais, segundo as últimas informações. Um rombo dessa monta leva-nos a questionar sobre a verdadeira capacidade dos mecanismos de governança corporativa de proteger os investidores. Tal questionamento torna-se particularmente importante quando se leva em conta que as instituições financeiras administram poupanças alheias.
        O caso do PanAmericano vem se somar a outros escândalos financeiros ocorridos num passado recente, tais como Enron, Crédit Lyonnais, Parmalat e Société Générale. A repetição de eventos dessa natureza mostra que, apesar dos avanços significativos alcançados na última década, os mecanismos de governança corporativa – com destaque para as auditorias independentes – continuam a apresentar fragilidades na tarefa de proteger os investidores e, por conseguinte, a sociedade como um todo. Afinal de contas é, direta ou indiretamente, com recursos do contribuinte que esses rombos são geralmente cobertos sob o argumento de contágio do sistema. Um novo modelo de governança é possível. O tema merece a nossa reflexão.

Antonio Dias Pereira Filho, doutor em Administração pela Université de Grenoble 2 (França), é professor da UFMG, coordenador do Neafe e membro da Academia Leopoldinense de Letras e Artes - ALLA.


do site: www.gestopole.com.br

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